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A Cidade é Nossa

Comparando as propostas ambientais dos candidatos à Prefeitura de SP

Raquel Rolnik

29/10/2020 12h44

Foto: Verde SP

Continuando a série de artigos sobre os programas de governo dos candidatos à prefeitura da cidade de São Paulo no próximo pleito (veja também os temas habitação e mobilidade), chegou a hora de falar sobre meio ambiente.

Começando a conversa, São Paulo produz 20 mil toneladas de lixo todo dia, de acordo com levantamento de 2019. Assim, não é de se espantar o consenso entre os programas de diversos candidatos em relação à necessidade de se aumentar a reciclagem do lixo, mas esta convergência acaba quando analisamos de que forma as candidaturas pretendem abordar o tema.

Para Celso Russomanno (Republicanos), e também, para o atual Prefeito e candidato Bruno Covas (PSDB), estas ações deveriam se traduzir em investimentos mais pesados na chamada economia circular. O programa de Russomanno defende que, a fim de alcançá-la, é necessário "integrar a cidade de São Paulo à essa economia circular como um todo, integrando acordos setoriais, política tributária, concessões de saneamento, área social e geração de energia". A ideia da economia circular também aparece no programa de Márcio França (PSB), inclusive com a instituição de uma moeda verde para os programas de reciclagem e banco de alimentos.

Guilherme Boulos (PSOL) e Jilmar Tatto (PT) propõem que o aumento da reciclagem e o desafogamento dos nossos aterros sanitários deve se dar com a ampliação da coleta seletiva — atingindo também as periferias —, e com a melhoria da capacidade das centrais de triagem e sua integração, sendo o fortalecimento das cooperativas de catadores ponto vital. Boulos e Tatto também defendem a revisão dos contratos com as concessionárias de serviço de lixo. Neste tema, o candidato do PSOL propõe ainda um aprimoramento e continuidade do programa de compostagem de resíduos orgânicos, a fim de diminuir o uso de aterros e gerar adubo sem veneno para as hortas, parques e praças da cidade.

Sobre as hortas, é importante dizer que no programa de Boulos há um forte apoio à agroecologia, às hortas urbanas e ao alimento saudável, sem veneno, inclusive na merenda escolar, o que também vai aparecer nos programas de Márcio França e Jilmar Tatto, candidato que pretende fomentar a agricultura urbana e periurbana na produção de alimentos agroecológicos e orgânicos, distribuindo-os para a população em condição de insegurança alimentar. Estas propostas não surgiram do nada: os paulistanos têm uma relevante produção agroecológica e urbana, que você pode conhecer acessando o portal Sampa+Rural. A pauta da agricultura sustentável é fundamental se pensarmos que, além da importância da alimentação saudável no município, sabe-se que um terço do território da cidade de São Paulo é rural, com florestas nativas, reservas indígenas e mananciais de água.

Além do tema do lixo e da agricultura, outra questão ambiental de muito impacto para os paulistanos é a água. A pandemia foi marcada por recomendações de diversas instituições políticas e especialistas sanitários de se lavar as mãos e fazer higienização constante do próprio corpo, das roupas, dos utensílios, etc. Nisso, moradores da Favela 1010 (e de tantos outros lugares) não tinham acesso à água para seguir os protocolos de saúde. É no programa de Boulos que aparece mais claramente a ideia de se exigir da Sabesp, concessionária dos serviços de água e esgoto da cidade cuja titularidade é do município, que colete e trate todo o esgoto e ofereça água de qualidade e com regularidade para toda a cidade, principalmente para as periferias. Joice Hasselmann (PSL) defende investimentos privados em saneamento em entendimentos com a SABESP.

E os parques? No plano de Covas, vemos a promessa de implantação de novos, como o Parque Augusta e Parque Paraisópolis. No programa de candidatura do atual prefeito, há claramente a sinalização da continuidade do programa de concessão e privatização dos parques. Isso também aparece nas propostas de Hasselmann, candidata adepta da ideia de que o aumento das áreas verdes e a melhoria do saneamento se darão por meio de mais parcerias e investimentos privados.

Tatto e Boulos não compartilham dessa lógica. A tônica dos planos destes candidatos não é de privatização de parques, mas sim de uma gestão destes espaços compartilhada com a população. Tatto, além do Parque Augusta, inclui o Parque do Bexiga em seu programa.

Por fim, em termos mais gerais, para Russomanno, as formas de controle ambiental devem ser revistas no sentido de propiciar mais agilidade nas aprovações de projetos. Arthur do Val (PATRIOTA) vai mais longe na liberalização ao afirmar que as mazelas ambientais, como espraiamento urbano, poluição atmosférica decorrente do trânsito, e comprometimento das represas, serão resolvidas quando os controles urbanísticos e ambientais que hoje regulam as construções na cidade forem liberados, permitindo assim a construção de enormes arranha-céus — que, em sua visão, concentrariam as populações no centro da cidade, diminuindo deslocamentos.

Sobre a autora

Raquel Rolnik é arquiteta e urbanista, é professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Foi diretora de planejamento da Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo(1989-92), Secretária Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades (2003-07) entre outras atividades ligadas ao setor público. De 2008 a 2014 foi relatora especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada. Atuou como colunista de urbanismo da Rádio CBN-SP, Band News FM e Rádio Nacional, e do jornal Folha de S.Paulo, mantendo hoje coluna na Rádio USP e em sua página Raquel Rolnik. É autora, entre outros, de “A cidade e a lei: legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo” (Studio Nobel, 1997), “Guerra dos lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças (Boitempo, 2016) e “Territórios em Conflito - São Paulo: espaço, história e política” (Editora três estrelas, 2017).