Topo

A Cidade é Nossa

Cem anos de Athos Bulcão e a arte desenhando a arquitetura

Raquel Rolnik

16/07/2018 10h41

Athos Bulcão, artista carioca radicado em Brasília (DF), está sendo homenageado este ano, em função da comemoração do  centenário de seu nascimento. Um dos grandes nomes não só brasileiros, mas internacionais, Bulcão mostra a conexão entre a arte e arquitetura. Muitos conhecem seus grandes murais, feitos principalmente com azulejos em composições abstratas que retomam a tradição árabe–portuguesa da azulejaria, mas introduzem uma linguagem modernista.

Bulcão começou a sua trajetória de artista trabalhando com Candido Portinari – este também um grande muralista –  no painel da Igreja de São Francisco de Assis, em Pampulha, em Belo Horizonte (MG). Lá se encontrou com Oscar Niemeyer, e foi convidado por este para  fazer os painéis do Congresso Nacional, do Brasília Palace Hotel, da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima,  entre outras obras,  em Brasília. Também colaborou com  João Filgueiras Lima, o Lelé, arquiteto mestre da pré-fabricação de elementos, uma verdadeira "fábrica" de arquitetura sem perda do sentido  plástico, artístico, das obras. O resultado dessa parceria entre Athos Bulcão e Lelé pode ser visto, por exemplo, na Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação, tanto em Brasília e Belo Horizonte, como em Salvador (BA), Fortaleza (CE) e São Luís (MA).

O que mais instiga no trabalho do Athos Bulcão é sua intensa participação na própria arquitetura dos edifícios. Não se trata absolutamente de murais para "enfeitar" a arquitetura, mas de uma participação ativa na composição do ambiente. Os murais contribuem para definir a percepção dos edifícios, destacar seus elementos estruturais, o que é feito através da cor, do movimento, do ritmo, das ilusões de ótica, fazendo com que os espaços vibrem, pareçam maiores ou menores, e definindo  o próprio ritmo do percurso do usuário dentro dos prédios.

Em outras de suas obras, Bulcão participa da própria construção, ao permitir, a partir dos elementos geométricos que definem sua linguagem, que os próprios azulejistas  definissem a composição à medida em que a obra ia se desenvolvendo.

Bulcão fez parte de uma geração de artistas brasileiros que apostaram na construção de Brasília como uma possibilidade de desenvolver uma arte pública, para todos, fora do confinamento dos museus. Sua obra portanto, além de conectada à arquitetura, desenha a cidade.

::. Conheça obras de Athos Bulcão

::. Como a obra de Athos Bulcão integra a arte à arquitetura

::. Análises e relações entre quatro obras de integração arquitetônica de Athos Bulcão

::. Athos Bulcão em Brasília – do azulejo, do espaço

Sobre a autora

Raquel Rolnik é arquiteta e urbanista, é professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Foi diretora de planejamento da Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo(1989-92), Secretária Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades (2003-07) entre outras atividades ligadas ao setor público. De 2008 a 2014 foi relatora especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada. Atuou como colunista de urbanismo da Rádio CBN-SP, Band News FM e Rádio Nacional, e do jornal Folha de S.Paulo, mantendo hoje coluna na Rádio USP e em sua página Raquel Rolnik. É autora, entre outros, de “A cidade e a lei: legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo” (Studio Nobel, 1997), “Guerra dos lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças (Boitempo, 2016) e “Territórios em Conflito - São Paulo: espaço, história e política” (Editora três estrelas, 2017).